Até que assim está bom. No começo foi difícil, claro, nada mais natural. Era estranho acordar e não ter ninguém do lado. Depois de um tempo a gente acostuma a dormir sempre com a mesma pessoa e aquele vazio do outro lado da cama é esquisito. Mas, do mesmo jeito, depois de um tempo a gente também acostuma a não ter por perto alguém que se mexe enquanto dorme. Daí dá um pouco de solidão, mas aparece outra pessoa maravilhosa, a gente se sente em casa e fica tudo melhor. Mas depois a outra pessoa maravilhosa também some e as coisas ficam dificeis de novo. E, de novo, a gente acostuma.
Até que está bom assim, sozinho por um tempo. Melhor, até. Eu nunca devia ter me envolvido de novo tão rápido. O certo seria ter dado um tempo para engolir direito as coisas, depois digerir e, finalmente, expelir. Agora tenho que fazer isso duas vezes ao mesmo tempo, mas tudo bem. Nada de impossível. Vai aí um pouco de malabarismo emocional, mas dá para levar.
E tem um monte de vantagens: se eu saio e dá vontade de voltar cedo, tudo bem. Se dá vontade de virar a noite, depende só de mim. Se quero acordar cedo, ou acordar tarde, mesma coisa. Se eu, que não tenho rotina nem horário, quiser sair numa terça-feira e ficar na rua até o sol raiar, sem crise, porque ninguém tem que bater cartão no dia seguinte.
Se quero acordar às oito no domingão, tomar café da manhã com calma, ler o jornal e ir a pé ver um concerto no MCB, ótimo, não tem ninguém para consultar, chamar para ir junto e correr o risco de ouvir um sonoro 'não', afinal onde já se viu levantar antes das três da tarde em pleno domingo?
Se dá vontade de fazer experiências culinárias, não preciso pensar no paladar de alguém que não eu mesmo: faço o que me dá na telha e geralmente dá certo. E, se não der, azar. Faço um sanduíche e pronto.
Quero passar na locadora e pegar um filme nacional, um cabeça e um de ação bem idiota, sem nenhuma comédia romântica? Sem problemas. Deu na telha passar o dia lendo alguma coisa que já li trocentas vezes? Sem problemas. Estou a fim de viajar? É só enfiar uma mochila no carro e pé na estrada. Não estou com a mínima de viajar? Perfeito. Fico por aqui. Sem crises, críticas, birras, ou bicos.
Aliás, está ótimo assim. Relacionamento é um saco. Muito melhor não ter que prestar contas a ninguém a não ser a mim mesmo, não dever lealdade a ninguém a não ser eu mesmo, não ter que afagar o ego de ninguém, não ter que gastar neurônios pensando em coisas românticas para fazer, não ter que comprar um vinho que não seria a minha primeira opção porque a minha primeira opção seria a última da outra pessoa e vice-versa e por isso chegamos a um acordo e bebemos um vinho que não é o predileto de ninguém. Não ter que lembrar aniversários e outras datas e ficar com cara de idiota quando esqueço e ficar com cara de idiota frustrado quando lembro, mas a outra pessoa não.
Melhor, mesmo, ficar sozinho por um tempo até digerir tudo e não sobrar mais nada que possa causar um revertério súbito. O melhor é passar um bom tempo sozinho, curtir a solteirice, ver todas as exposições que quiser, ir a tudo que é vernissage, escutar Slipknot, ou Orishas, ou Bizet, ou música de gaita-de-foles sem reclamações, trabalhar de madrugada e dormir de dia se for o caso. Se eu falar em fazer mais uma tatuagem, não vai ter ninguém perguntando se vai ser o nome dela.
Muito melhor desse jeito. Ainda mais agora, que estou acostumado a acordar sozinho e não sinto mais falta de ter alguém por perto. A gente se acostuma com tudo e, mais cedo ou mais tarde, vou ter é que acostumar de novo a dormir acompanhado. De preferência mais tarde, não mais cedo. Afinal, assim está ótimo, o mundo é meu e de mais ninguém, eu sou meu e de mais ninguém.
E aí, tô conseguindo enganar alguém?
27 de dez. de 2008
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