Ia escrever um treco de Ano Novo, bem-humorado, feliz, otimista, que  tivesse a ver com a vida de todo o mundo. Mas não saía nada além de  elocubrações chatas e estéreis sobre a crise financeira. Desisti e  resolvi escrever um outro treco de Ano Novo mais intimista,  introspectivo, sei lá... Mas saiu meio irritado, raivoso, triste. E o  fato é que hoje estou super-feliz e nem um pouco a fim de escrever  coisas pesadas. Tudo bem, já escrevi, está quase pronto. Mas não vou  publicar. Fica de reserva.
Tenho dois textinhos prontos para casos como este, de querer postar, mas  estar sem idéia. Só que os dois também são bravos, tristes, até  misantrópicos. E hoje não estou nem um pouco misantropo. Então ficam lá  no HD esperando a sua chance. Um dia, quem sabe?
Bom humor parece não fazer bem para a minha inspiração. E fico com cara  de bobo aqui na frente do computador, querendo escrever, mas sem  conseguir, olhando para a cara do media player na tela da esquerda,  fazendo cores e desenhos hipnóticos para mim. Não encontrava meu CD de  jazz, devo ter deixado na casa de alguém, e resolvi gravar um novo  durante o dia enquanto trabalhava. Só jazz, não. Jazz e blues.
Uma tremenda mistureira, na verdade. Meus amigos músicos iam ficar  envergonhados. Ou eu ia, se eles vissem. Botei de tudo um pouco: dois  Johns (Coltrane e Pizzarelli), Lightnin’ Hopkins, Nina Simone, dois  Johnsons (Robert e Blind Willie)... Enfim, como eu já disse, tremenda  mistureira.
De alguns, gravei álbuns inteiros. De outros, pincei umas coisas aqui,  outras ali... Fiquei chateado porque não achei a minha predileta da Nina  Simone. Que, já aviso, é polêmica: as pessoas me perguntam de qual a  música dela mais gosto e já me preparo para ouvir montes depois de  responder. Enfim, é Strange Fruit. Eu sei. Eu sei! Ela não é a  cantora “oficial” dessa. Mas, com todo o respeito devido à dona Billie,  tia Nina mata a pau.
Tem músicas que a gente precisa sentir entrar pelos ouvidos, descer pela  garganta, alojar-se no estômago, destroçar a alma com os dentes e sair  pelo meio do peito como se fosse o pior pesadelo do Giger. Essa é uma. E  Billie Holiday, por mais Billie Holiday que seja, para mim não chega  aos pés da Nina quando a idéia é não deixar pedra sobre pedra.
Outra música que para mim também é assim, na verdade é bem diferente:  doce, calma, suave... te deixa num clima gostoso, e vêm os dois últimos  versos e te pegam desprevenido e te dão uma voadora no meio do peito.  Uma voadora sutil, vá lá, mas ainda assim... É I’m Alright Now,  que tenho gravada pelo Pizzarelli. Fala do cara voltando à ativa depois  de ser largado pela mulher e das coisas que tem feito e de como está bem  melhor agora... e termina: “Of course I cry myself to sleep most every  night / But with that slight exception I’m alright”.
Olha lá eu de novo. Tentando escrever algo gostoso para me despedir do  ano que vai de um jeito legal e chutando o pau da barraca. Juro que eu  estou de bom humor. Juro!
Assinar:
Postar comentários (Atom)
 
 
Nenhum comentário:
Postar um comentário